terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Mamífero da Mata Atlântica ameaça a biodiversidade dos Estados Unidos

Ratão-do-banhado (Myocastor coypus), conhecido como nutria nos Estados Unidos, em uma das lagoas do Hermann Park, em Houston, Texas (EUA)

O Hermann Park é um parque urbano de Houston, Texas, com imensas lagoas, plantas nativas e muitos animais silvestres livres, que usam esta área preservada como habitat. Aves migratórias como os belíssimos patos selvagens da América do Norte também são frequentadores assíduos das lagoas deste parque.

Chamou nossa atenção um mamífero muito simpático – e população bastante numerosa - que habita as lagoas do Hermann Park por ser semelhante ao nosso ratão-do-banhado (nome científico: Myocastor coypus), animal de porte médio, que pesa 15 kg e chega a medir 140 cm com a cauda, se alimenta de plantas aquáticas e semi-aquáticas, incluindo suas raízes, e ocorre nos banhados da Mata Atlântica de Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul e Sul de São Paulo, Paraguai e na Província de Missiones na Argentina.

Nós sabemos que alguns animais que ocorrem na Mata Atlântica têm sua distribuição geográfica estendida até o Texas.  Então, fui pesquisar sobre a fauna do Hermann Park e descobri que se trata mesmo do nosso ratão de banhado (Myocastor coypus), que aqui os norte-americanos chamam de nutria.

Enquanto que no Sul do Brasil, pelo menos em Santa Catarina, é um animal cada vez mais raro, correndo o risco de desaparecer devido a caça e perda do hábitat, aqui são muito comuns e como tantos outros animais silvestres prosperam no meio de uma região metropolitana com 6 milhões de pessoas.

Há anos tento fotografar um nos banhados em Itaiópolis (SC), mas é muito arisco e sempre foge. Aqui, no Hermann Park, foi moleza, eles até fazem pose para as fotos, aparecem com os filhotes brincando e vêm nadando até a borda da lagoa onde a gente está e chegam até a sair da lagoa sem se importar com as pessoas próximas. Só faltou nadarem de costas para se exibirem.

Agora vou contar a parte ruim, muito chocante, que descobri sobre o ratão de banhado que prospera aqui. Na verdade, ele não é nativo, é uma espécie invasora. Foi trazido (do Sul do Brasil, Argentina ou Paraguai) por criadores do estado vizinho de Luisiana em 1930 para produção de peles. Então, seguindo exatamente o mesmo roteiro das espécies invasoras pelo Mundo afora, alguns acabaram escapando ou foram soltos na natureza e se tornaram um gravíssimo problema ambiental para os ecossistemas de áreas alagadas da região sul dos Estados Unidos.

A fêmea do ratão de banhado atinge a maturidade sexual com três meses, cada ninhada chega a ter 11 filhotes, mas a média é de 5 filhotes e por ano tem duas ninhadas e mais uma terceira a caminho. Então, é só fazer as contas para perceber como é explosivo crescimento populacional se não tiver predadores naturais. Na Mata Atlântica, a população do ratão-do-banhado é baixa e fica em equilíbrio porque nas áreas preservadas temos muitos predadores, como a onça-parda, jaraguatirica, gato-do-mato (come os filhotes) e o jacaré-de-papo-amarelo em algumas áreas alagadas.





Ratão-do-banhado (nutria) com filhotes em uma das lagoas do Hermann Park, em Houston, Texas
Então, neste cenário sem predadores, o ratão-do-banhado se multiplicou aos milhares nas áreas alagadas protegidas dos parques e estão devorando toda a vegetação nativa aquática e semi-aquática, causando erosão nas margens dos rios, destruindo os banhados em larga escala, afetando a reprodução dos peixes e consequentemente a população de aves e de outros animais, podendo causar um colapso nestes ecossistemas e levar a extinção várias espécies de animais se nada for feito. Os dois parques estaduais de áreas alagadas na área metropolitana de Houston estão completamente infestados de ratões do banhado. Uma situação não muito diferente de toda região costeira do Golfo do México. No famoso lago protegido do Texas, Eagle Lake, a 100 km a oeste de Houston,  onde ocorrem aves ameaçadas de extinção, uma espécie de pato selvagem estava desaparecendo devido ao impacto causado pela superpopulação do ratão-do-banhado.

O problema desta espécie invasora é muito preocupante e está exigindo ações urgentes das autoridades que estão adotando medidas extremas. Ano passado, o Departamento de Vida Selvagem e Pesca (Department of Wildlife & Fisheries) de Luisiana ofereceu uma recompensa de 5 dólares por cada ratão-do-banhado abatido. Para receber a recompensa era necessário apresentar apenas a cauda como comprovante. Resultado, em apenas um ano tiveram que pagar 1,8 milhões de dólares em recompensas, porque foram mortos 350.000 ratões de banhado em Luisiana. Algumas prefeituras de Luisiana estão montando verdadeiros esquadrões especializados (tipo a SWAT) somente para abater os ratões de banhado nas áreas de preservação.


A fama do nosso ratão do banhado ficou tão ruim por aqui que na catástrofe do furacão Issac, que atingiu Luisiana em 2012, o repórter da NBC escreveu que a única coisa boa do furacão foi ter matado milhares de nutrias (ratões do banhado). Em uma praia do Golfo de México, em Luisiana, foram contadas 20 mil carcaças de ratões do banhado mortos por afogamento entre toneladas de touceiras da vegetação de banhados arrancadas pela inundação provocada pelo furacão Issac. Veja na imagem a grande quantidade de carcaças, que não deixa dúvidas que os banhados da região costeira do Golfo do México estão realmente infestados de ratões-do-banhado.




Grande quantidade de Ratões-do-banhado ou nutria mortos na inundação causada pelo Furacão Issac de 2012. Foto da matéria da NBC News "Thousands of dead nutria pile up on Mississippi beaches after Isaac" Tuesday Sep 4, 2012
Nada disso estaria acontecendo se não tivessem trazido nosso ratão-do-banhado para cá em 1930. É até compreensível que 85 anos atrás não se tinha muita noção dos impactos que uma espécie invasora poderia causar. Como não podemos voltar ao passado para evitar este erro, deveríamos aprender com ele, diz a lógica. No entanto, ainda hoje há empreendedores no Brasil criticando, com apoio da imprensa, os órgãos ambientais como o IBAMA, por não liberarem a criação de determinadas espécies exóticas, que são espécies de animais ou plantas nativas de outros países ou regiões.





Filhotes do ratão de banhado brincando em uma das lagoas do Hermann Park, em Houston, Texas
Biguá, uma das espécies de aves silvestres que frequentam o Hermann Park, em Houston, Texas



 
Vídeo do ratão-do-banhado (Myocastor coypus), conhecido como nutria nos Estados Unidos, se alimentando de plantas aquática em uma das lagoas do Hermann Park, em Houston, Texas (EUA)


3 comentários:

Mayorca tecnologias disse...

Germano ! Muito interessante, vou compartilhar no FB , vou colocar nas referências do mega-evento: PROTOCOLO DE JOINVILLE CONTRA A EXPLOSÃO DEMOGRÁFICA MUNDIAL (www.amayorca.blogspot.com.br) . Também vou inserir a invasão da Píton Birmanesa na Flórida e a invasão de humanos n

Unknown disse...

Excelente postagem, parabéns!

Unknown disse...

Bacana