Jornal da Ciência (Publicação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC), Rio de Janeiro, 06/08/2007
Por Germano Woehl Junior*
Este artigo é uma contribuição para ajudar a esclarecer as dúvidas sobre este tema tão relevante para a humanidade neste momento, que talvez seja o prazo final para decidirmos nosso destino, entre o colapso e a prosperidade.
O fato é que não deveria haver dúvida alguma de que o homem arruinou o planeta e que é o único responsável pelo aquecimento global, pois há consenso sobre isso entre todos os cientistas mais notáveis do planeta, um fato raro na história da ciência. Esta unanimidade vem da análise de dados científicos bem consistentes, que foram medidos e coletados meticulosamente, usando equipamentos da mais avançada tecnologia. A conclusão é incontestável: o homem colocou a vida no planeta em grave perigo.
Alguns órgãos de imprensa têm sido os principais culpados por causar esta dúvida nas pessoas. Lamentavelmente, cometem um equívoco ao dar crédito a opiniões de pessoas sem respaldo na comunidade científica, que dão apenas palpites, sem comprovação científica alguma de seus argumentos, provocando a falsa impressão de que a comunidade científica está dividida e num acirrado debate se o homem é ou não responsável pelo aquecimento global.
A situação é mais ou menos a seguinte: para cada 100 cientistas sérios alertando que o homem está causando o aquecimento global, com argumentos científicos bem fundamentados, existe um indivíduo, sem prova científica alguma, dando nada mais do que um palpite negando o fato. Então, alguns jornais passaram a dividir democraticamente o espaço, dando a mesma importância para a conclusão deste grupo de 100 cientistas sérios e para o palpite deste indivíduo, que sem base científica afirma que as causas do aquecimento devem-se a ciclos naturais do clima na Terra.
A respeito das conseqüências devastadoras do aquecimento global sobre a vida na Terra, que obviamente também atingirá a nossa vida, só nos resta saber quando vão ocorrer. E neste ponto os cientistas têm errado: estão acontecendo bem antes do esperado e com intensidade maior do que o previsto em simulações por computador. Um exemplo foi o que ocorreu na Antártica com a plataforma de gelo Larsen-B, que tinha 240 km de comprimento e 50 km de largura, prevista para derreter em 100 anos. Ela se desprendeu e derreteu em apenas 35 dias, no início de 2002. Isso comprova que os efeitos podem não ser graduais como a nossa geração gostaria (para deixar a conta para a próxima geração, quando não estivéssemos mais por aqui). A conta a ser paga pode surgir subitamente e nos surpreender.
Sempre me interessei pela preservação da natureza e desde a época de estudante de física, há 28 anos, tenho acompanhado atentamente este assunto, lendo muitos dos artigos científicos publicados nas mais respeitáveis revistas científicas especializadas e não dava para duvidar da qualidade dos resultados apresentados. Então, associando estes estudos que vinham sendo divulgados, fui ficando cada vez mais angustiado ao perceber que a devastação intensa da Mata Atlântica em Santa Catarina, mais especificamente das Matas de Araucárias no planalto norte, além de ceifar instantaneamente a vida de milhares de bichos que habitavam a área desmatada, estava contribuindo também para aniquilar a nossa própria espécie um pouco mais adiante.
Já que não dispomos de outro planeta para viver e achamos que não é ético negarmos a perpetuação da vida para milhares de organismos, incluindo a nossa própria espécie, minha esposa e eu decidimos criar uma ONG, o Instituto Rã-bugio para Conservação da Biodiversidade, para defender continuidade da vida por aqui. Nossa atuação é através da educação ambiental nas escolas para mostrar para a garotada a importância da preservação das últimas áreas de Mata Atlântica.
A sociedade precisa ser informada para não ser iludida com as propostas mirabolantes e demagógicas, como o plantio de árvores para salvar o planeta diante de um quadro alarmante de desmatamento legal e ilegal, tanto na Mata Atlântica, já quase extinta, como na Floresta Amazônica. Para produzir as mudas, transportá-las e plantá-las, libera-se mais gás carbônico do que a quantidade que será absorvida. Há estudos mostrando que se continuarem a desmatar, a concentração de gás carbônico na atmosfera vai aumentar significativamente a curto prazo, agravando, e muito, o aquecimento global, de modo que por muitas décadas os níveis permanecerão num patamar muito mais elevado do que é hoje – que já é suficiente para nos conduzir ao colapso -, e de nada vai adiantar cobrir o planeta com mudas de árvores, pois levarão muito tempo para crescerem e mesmo após este tempo não conseguirão retirar da atmosfera todo o gás carbônico emitido pela destruição das matas nativas. Lembrando que o desmatamento acaba com a vida dos animais que vivem ali, e o simples plantio de árvores não devolve a biodiversidade de uma floresta.
O que podemos fazer? Se quisermos resolver com seriedade o problema do aquecimento global, e da nossa sustentabilidade neste planeta, todo o esforço da sociedade deve ser empreendido no sentido de parar o desmatamento imediatamente, já! Se obtivermos êxito neste primeiro desafio, aí sim poderemos partir para os próximos: fontes alternativas de energia, projetos de seqüestro do carbono para reduzir os índices aos níveis da era pré-industrial permitindo a regeneração de florestas nativas, plantando árvores etc. Se não conseguirmos vencer nem este primeiro desafio, que não depende de avanços tecnológicos e tampouco gera desenvolvimento – só dependem do simples cumprimento das leis – podemos nos preparar para o pior, que nos espera num futuro bem próximo. Preservar o que resta de nossas florestas é a maneira mais racional e óbvia de prolongar nossa vida na Terra.
*Doutor em Física e Ambientalista, fundador do
Instituto Rã-bugio para Conservação da Biodiversidade
Jaraguá do Sul, SC
www.ra-bugio.org.br
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